Os videogames têm conquistado um lugar de destaque na cultura contemporânea, proporcionando experiências interativas e imersivas que cativam jogadores de todas as idades ao redor do mundo. No entanto, à medida que a popularidade dessas formas de entretenimento cresce, também surgem preocupações sobre os possíveis efeitos negativos que o uso excessivo pode acarretar. Um desses efeitos é o vício em videogames, um fenômeno que tem atraído a atenção de pesquisadores e profissionais da saúde mental.
Recentemente, o vício em videogames foi oficialmente reconhecido como um transtorno de saúde mental pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em sua 11ª revisão da Classificação Internacional de Doenças (CID-11), promovendo discussões acerca de sua natureza e impacto na vida das pessoas. Neste artigo, exploraremos a classificação do "gaming disorder" na CID, bem como suas características distintivas e o papel desempenhado pela OMS na identificação e tratamento desse transtorno.

Os videogames, originalmente concebidos como uma forma de entretenimento, evoluíram significativamente ao longo dos anos. Hoje, eles englobam uma ampla variedade de gêneros e plataformas, desde consoles de jogos até dispositivos móveis. Essa diversidade de opções permite que jogadores mergulhem em mundos virtuais, resolvam desafios complexos e interajam com outras pessoas online, proporcionando uma experiência envolvente e emocionante.
Contudo, o lado negativo dessa imersão profunda em videogames tornou-se uma preocupação crescente, especialmente quando o jogo se torna excessivo e prejudicial à vida diária do indivíduo. A OMS reconheceu essa problemática em sua mais recente revisão da CID, que entrou em vigor em janeiro de 2022. O termo "gaming disorder" foi incluído nessa lista, estabelecendo uma definição clara e reconhecendo o vício em videogames como um problema de saúde mental que merece atenção adequada.
Características do transtorno por uso de jogos eletrônicos
O transtorno por uso de jogos eletrônicos, popularmente conhecido como vício em videogames, é caracterizado por um padrão de comportamento em que o indivíduo enfrenta dificuldade em controlar a frequência e a duração do tempo dedicado aos jogos. Essa compulsão pode levar à negligência de outras atividades e interesses, prejudicando áreas essenciais da vida cotidiana.
A inclusão do "gaming disorder" na Classificação Internacional de Doenças (CID-11) pela OMS baseia-se em critérios específicos que permitem identificar casos de vício em videogames. Os principais aspectos que compõem esse transtorno são os seguintes:
1. Dificuldade de controle: Indivíduos que sofrem de vício em videogames têm problemas em controlar a quantidade de tempo gasto jogando. Mesmo quando tentam reduzir o tempo dedicado aos jogos, podem enfrentar dificuldades em fazê-lo.
2. Priorização do jogo: O jogo passa a ocupar um lugar central na vida do indivíduo, ganhando prioridade em relação a outras atividades importantes. Compromissos sociais, acadêmicos ou profissionais podem ser negligenciados em favor do tempo dedicado aos videogames.
3. Continuação do comportamento apesar de consequências negativas: Mesmo quando as consequências do vício em videogames são evidentes, como prejuízos nas relações pessoais, no desempenho acadêmico ou no trabalho, o indivíduo continua a se engajar no comportamento problemático.
Esses critérios refletem um padrão de comportamento consistente e duradouro, não sendo suficiente que o indivíduo tenha jogado videogame de forma intensa por um ou dois dias. A presença desses comportamentos deve ser observada por um período de pelo menos 12 meses para que o diagnóstico de vício em videogames seja considerado.
É essencial destacar que nem todo uso intenso de videogames se enquadra automaticamente como um transtorno. O diagnóstico de "gaming disorder" é feito quando esses comportamentos problemáticos causam prejuízos significativos nas diversas esferas da vida do indivíduo e quando não são explicados por outras condições médicas ou psicológicas.

Prevalência e fatores de risco do vício em videogames
A prevalência do vício em videogames tem sido objeto de interesse para pesquisadores em todo o mundo. Embora seja difícil obter números precisos, estudos sugerem que uma minoria de jogadores desenvolve um comportamento problemático em relação aos videogames, indicando que a maioria dos indivíduos joga de forma saudável e moderada.
Os fatores de risco associados ao desenvolvimento do vício em videogames são diversos e variam de pessoa para pessoa. Alguns dos principais elementos que podem aumentar a probabilidade de alguém desenvolver um comportamento problemático relacionado aos jogos incluem:
1. Isolamento social: A solidão e o isolamento social podem levar algumas pessoas a buscar refúgio nos mundos virtuais dos videogames, buscando conexão e interação online para preencher a falta de relacionamentos significativos na vida real.
2. Condições mentais pré-existentes: Pessoas que sofrem de ansiedade, depressão ou outros transtornos mentais podem recorrer aos videogames como uma forma de escape ou alívio temporário, o que pode levar ao desenvolvimento do vício.
3. Altos níveis de estresse: O estresse crônico pode impulsionar a busca por atividades que proporcionem prazer imediato e distração, tornando os videogames uma escolha atraente para lidar com a pressão e as tensões do cotidiano.
4. Falta de atividades significativas offline: A ausência de atividades significativas e satisfatórias fora do mundo dos videogames pode levar ao aumento do tempo dedicado aos jogos, tornando-os a principal fonte de gratificação e satisfação.
5. Ambientes familiares e sociais disfuncionais: Ambientes familiares ou sociais com disfunções podem levar os indivíduos a buscarem escapismo e consolo nos videogames, criando um ciclo vicioso que dificulta a saída dessa dinâmica.
É importante ressaltar que a presença de um ou mais desses fatores de risco não significa que uma pessoa desenvolverá necessariamente um vício em videogames. O desenvolvimento desse transtorno é multifatorial, e diversos aspectos individuais e ambientais podem interagir para levar ao comportamento problemático.
O reconhecimento dos fatores de risco é crucial para identificar indivíduos em maior vulnerabilidade e oferecer intervenções adequadas de forma preventiva. Ao entender esses aspectos, é possível estabelecer abordagens terapêuticas mais efetivas para lidar com o vício em videogames e promover um uso saudável e equilibrado dessas tecnologias.
Impacto do vício em videogames na vida cotidiana
O vício em videogames pode ter um impacto significativo na vida das pessoas afetadas, repercutindo em diversas áreas do seu dia a dia. As consequências do "gaming disorder" podem ser abrangentes e variar de indivíduo para indivíduo. Neste tópico, exploraremos os principais impactos desse transtorno nos âmbitos pessoal, acadêmico e profissional.
1. Vida pessoal: O vício em videogames pode levar a uma desconexão significativa das interações sociais presenciais. À medida que os jogadores se aprofundam no mundo virtual, eles podem se afastar de amigos, familiares e atividades sociais. Isolamento e solidão podem se instalar, exacerbando ainda mais o desejo de escapar para o ambiente digital dos jogos.
2. Desempenho acadêmico: O excesso de tempo dedicado aos videogames pode afetar negativamente o desempenho acadêmico dos estudantes. A negligência das responsabilidades escolares em prol do jogo pode resultar em notas mais baixas, falta de concentração nas aulas e menor rendimento acadêmico geral.
3. Carreira profissional: O vício em videogames pode prejudicar o desempenho no trabalho, levando a atrasos frequentes, menor produtividade e, em casos extremos, até mesmo a perda do emprego. A compulsão pelo jogo pode interferir na capacidade de cumprir compromissos profissionais e priorizar tarefas importantes.
4. Saúde física e mental: O uso excessivo de videogames muitas vezes está associado a hábitos sedentários, o que pode levar a problemas de saúde, como falta de exercício físico, má alimentação e distúrbios do sono. Além disso, o vício em videogames pode aumentar o estresse e a ansiedade, afetando negativamente o bem-estar mental dos indivíduos.
5. Finanças pessoais: O vício em videogames pode ter um impacto financeiro significativo, especialmente quando os jogadores gastam grandes quantias em compras dentro dos jogos ou em assinaturas de serviços relacionados. Isso pode levar a problemas de endividamento e comprometer a estabilidade financeira.
Essas consequências podem se agravar ao longo do tempo, a menos que medidas adequadas sejam tomadas para tratar o vício em videogames. A compreensão dos impactos desse transtorno é fundamental para que familiares, amigos e profissionais de saúde possam identificar os sinais precoces e buscar intervenções terapêuticas apropriadas.

Diagnóstico do "gaming disorder" e a importância da observação a longo prazo
O diagnóstico do "gaming disorder" ou vício em videogames é feito com base em critérios específicos estabelecidos pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e descritos anteriormente, sendo: dificuldade de controle; priorização do jogo e; continuação do comportamento apesar de consequências negativas.
É importante ratificar que o diagnóstico do "gaming disorder" não pode ser feito com base em um único episódio ou período de uso intenso de videogames. A OMS estabelece que os critérios devem ser observados por um período de, no mínimo, 12 meses para que o diagnóstico seja considerado. Isso significa que os comportamentos problemáticos devem ser recorrentes e duradouros ao longo desse período.
Essa exigência de observação a longo prazo é essencial para evitar diagnósticos precipitados e garantir que o vício em videogames seja distinguido de comportamentos temporários ou eventos pontuais.
Profissionais de saúde mental desempenham um papel fundamental na avaliação e diagnóstico do "gaming disorder". Por meio de entrevistas, questionários e análises do histórico do paciente, eles podem identificar padrões consistentes de comportamento relacionados ao uso problemático de videogames.
Abordagens terapêuticas para o tratamento do "gaming disorder"
O tratamento do "gaming disorder" é um campo de estudo em constante evolução, uma vez que a classificação oficial desse transtorno ainda é relativamente recente. Atualmente, não há um consenso absoluto sobre a melhor abordagem terapêutica para lidar com o vício em videogames, mas diferentes estratégias têm sido testadas para ajudar os indivíduos a superarem esse desafio.
1. Psicoterapia: A terapia individual ou em grupo com um psicólogo ou terapeuta especializado em vícios pode ser uma abordagem eficaz. A terapia cognitivo-comportamental (TCC) é uma das abordagens mais utilizadas, visando identificar padrões de pensamento e comportamentos disfuncionais relacionados aos jogos e, assim, desenvolver estratégias para promover a mudança de comportamento.
2. Terapia familiar: O envolvimento da família é crucial, especialmente para adolescentes e jovens que enfrentam o vício em videogames. A terapia familiar pode ajudar a melhorar a comunicação, estabelecer limites saudáveis e criar um ambiente de apoio para o indivíduo em recuperação.
3. Intervenção em grupos de apoio: Participar de grupos de apoio específicos para pessoas com vício em videogames pode proporcionar um ambiente acolhedor para compartilhar experiências e receber suporte mútuo. Esses grupos oferecem uma rede de apoio para indivíduos que lutam contra o vício em videogames, promovendo a motivação para a mudança.
4. Educação e conscientização: A conscientização sobre os riscos do vício em videogames é fundamental para prevenir o desenvolvimento desse transtorno. Campanhas de conscientização podem alertar pais, educadores e jovens sobre a importância de um uso equilibrado e saudável dos jogos eletrônicos.
5. Intervenções tecnológicas: Algumas abordagens tecnológicas estão sendo exploradas, como aplicativos que monitoram e limitam o tempo gasto com jogos ou fornecem lembretes para pausas regulares.
É importante lembrar que cada indivíduo é único, e o tratamento do vício em videogames deve ser adaptado às necessidades específicas de cada pessoa. Além disso, o tratamento pode ser mais bem-sucedido quando combinado com a abordagem de uma equipe multidisciplinar composta por psicólogos, psiquiatras e outros profissionais de saúde.

Vício em videogames: Preocupações dos pais e orientações para um uso saudável
O vício em videogames entre crianças e adolescentes tem sido uma fonte de preocupação crescente para pais e responsáveis. Embora a maioria dos jovens jogue videogames de forma recreativa e equilibrada, é essencial estar atento a sinais de vício e compreender como promover um ambiente seguro e saudável em relação ao uso dessas tecnologias.
1. Estabelecer limites de tempo: É importante definir regras claras sobre o tempo permitido para jogar videogames. Os pais podem negociar um horário específico para os jogos, evitando que o uso se torne excessivo e prejudicial às outras atividades importantes, como estudos, exercícios e interações sociais presenciais.
2. Monitorar o conteúdo dos jogos: Verificar a classificação etária dos jogos é essencial para garantir que o conteúdo seja apropriado para a idade do jovem. Jogos com conteúdo violento ou inadequado podem ter um impacto negativo na mente em desenvolvimento.
3. Incentivar atividades offline: É fundamental promover uma variedade de atividades offline para as crianças e adolescentes. Oferecer oportunidades para o envolvimento em esportes, atividades artísticas, leitura e interações sociais presenciais pode ajudar a equilibrar o uso de videogames com outras experiências enriquecedoras.
4. Comunicar-se abertamente: Manter um canal de comunicação aberto com os filhos é crucial. Os pais devem encorajar os jovens a compartilharem suas experiências com os jogos, preocupações ou problemas que possam estar enfrentando, sem medo de serem julgados ou punidos.
5. Observar mudanças de comportamento: Ficar atento a mudanças significativas no comportamento dos jovens pode ajudar a identificar possíveis sinais de vício em videogames. Sinais como isolamento social, irritabilidade extrema ou negligência de responsabilidades podem indicar problemas relacionados aos jogos.
6. Modelar um uso saudável de tecnologia: Os pais são modelos importantes para seus filhos. Demonstrar um uso equilibrado e saudável de tecnologia, incluindo videogames, pode influenciar positivamente o comportamento dos jovens e encorajá-los a seguir um exemplo responsável.
7. Buscar apoio profissional: Se os pais suspeitarem que o filho está enfrentando problemas com o vício em videogames, é importante buscar apoio de profissionais de saúde mental. Especialistas podem oferecer avaliações adequadas e intervenções terapêuticas apropriadas para auxiliar no tratamento.
Promover uma relação saudável com os videogames é fundamental para garantir o bem-estar físico e mental das crianças e adolescentes. Embora os jogos possam ser uma fonte de diversão e aprendizado, é importante equilibrar o tempo dedicado a eles com outras atividades que promovam o desenvolvimento e a sociabilidade saudável.
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